Um Narrador sem nome conta sua história. Ele é jovem e fez tudo o que esperavam dele. Foi para faculdade, arranjou um emprego, comprou um apartamento e mais um monte de coisas. E mesmo assim não consegue dormir à noite. Em uma rotina maçante de trabalho, onde passa mais tempo dentro de um avião do que em casa, o Narrador sente um vazio que nada nem ninguém consegue preencher. Seus poucos momentos de paz acontecem nos diversos grupos de apoio que frequenta, onde finge ter doenças fatais e as usa como justificativa, pelo menos por algumas horas, para a grande dor e tristeza que carrega dentro de si - o que o ajuda a dormir melhor.
Contudo, um dia, uma mulher passa a frequentar os mesmos grupos de apoio que ele e rouba seus momentos de paz. Ela se chama Marla e o Narrador sabe que, como ele, ela não está morrendo e não deveria frequentar aqueles grupos. As coisas desandam ainda mais quando seu apartamento é destruído por uma explosão. Sem ter para onde ir, ele acaba ligando para Tyler Durden, um cara que conheceu em uma de suas viagens a trabalho. Tyler é falante, tem seu jeito próprio de ver a vida, gosta de quebrar regras e aprontar com os outros. Juntos em um bar, o Narrador e Tyler conversam sobre a vida e acabam criando o Clube da Luta.
O Clube da Luta nada mais é do que um bando de caras arrebentando uns aos outros sem razão qualquer. Com sete regras básicas, sendo que a primeira e a segunda delas é que você não fala sobre, o Clube da Luta acaba se tornando extremamente popular, afinal, o que não falta são homens como o Narrador e Tyler, jovens frustrados que encontram paz em libertar-se das amarras por alguns minutos através de seus punhos. Mas, aparentemente, Tyler quer ir além. Um transgressor e líder cativante, ele acaba criando outro projeto a partir do Clube da Luta, algo mais organizado e bem mais perigoso.
“Nada é estático. Até a Mona Lisa está caindo aos pedaços. (…) Talvez o autoaperfeiçoamento não seja a resposta. (…) Talvez autodestruição seja a resposta.” Pág. 58
O Narrador acaba sendo sugado para dentro dos planos de Tyler. Ele não entende exatamente o que Tyler está fazendo, assim como não compreende a relação do amigo com Marla, mas não consegue se manter longe. O Narrador precisa do Clube da Luta, precisa extravasar seu vazio, precisa sentir que sua existência não é em vão, precisa dormir. Marlaé maluca e Tyler é perigoso. E o Narrador está em um caminho de autodestruição sem volta.
A LEITURA
Apesar de ser uma obra contemporânea, Clube da Luta já é considerado um clássico. Depois de ver muita gente elogiando a obra e ter adorado outro livro do autor, Condenada, finalmente tive oportunidade de ler Clube da Luta e, apesar de já saber um grande spoiler da trama, o livro não me decepcionou. Eu já fui cativada logo nas primeiras páginas, a escrita de Palahniuk é incrível. Sua narrativa em primeira pessoa é muito ágil, tanto que, nos primeiros momentos fiquei bastante confusa, mas logo me acostumei a suas frases curtas recheadas de uma ironia cortante, humor negro cínico e ritmo acelerado.
Na resenha de Condenada, comentei que a obra caminhava entre a tênue linha do “insanamente sem noção” e do “insanamente genial” e acabei descobrindo que Clube da Luta não é diferente. A história tem um toques de loucura que faz tudo parecer um sonho irreal ao mesmo tempo em que soa bizarramente crível. Partes da trama, inicialmente, nos faz pensar “isso não é possível”, apenas para, em seguida, nos faz questionar “por que não seria?”. Palahniuk é aquele tipo de autor que, através de personagens e tramas incomuns, consegue entrar na cabeça do leitor, nos deixar viciados em sua obra e pensando bastante sobre elas e muitas outras coisas. Mesmo já sabendo de algo crucial da trama, a história de Clube da Luta conseguiu me surpreender e, até mesmo, me deixar sem fôlego e sem palavras em vários momentos.
A CRÍTICA DO LIVRO
A grande pegada de Clube da Lutaé que, em meio a uma trama tão inusitada que chega a ser bizarra e personagens meio malucos, o autor consegue passar reflexões e críticas profundas. A obra expõe, através do Narrador, principalmente, um medo que habita em todos nós: o vazio existencial. Absolutamente todo mundo sente uma necessidade imensa, seja de forma consciente ou não, de ter um sentido, um objetivo de vida. Entretanto, a nossa cultura capitalista ocidental não consegue prover essa necessidade, não realmente. Como o Narrador bem percebe, a maioria de nós segue as regras, faz o que deve ser feito, mas dificilmente é realmente feliz, realmente completo. Nós compramos e nos cercamos de um monte de coisas em tentativas falhas de esquecer a nossa própria insignificância. E o Narrador era assim, até que surgiu Tyler e seu Clube da Luta.
Além de criticar o capitalismo, o consumismo e toda a cultura ocidental conformista que os justificam, para mim, Palahniuk também critica a própria postura niilista que o livro apresenta. O Clube da Lutaé criado para oferecer aos lutadores um local e momento para extravasar suas frustrações, medos e desejos que não conseguem exprimir em outros momentos. Contudo, o Clube se transforma em outro projeto, que em determinado ponto vira quase que um culto que quer trazer caos, dor e destruição para o mundo. Mas, o próprio protagonista, o Narrador, demonstra repulsa pelo projeto em determinado momento e não consegue dar continuação ao seu desejo por autodestruição. Talvez muitas pessoas vão discordar, mas, pelo menos para mim, é isso que torna o livro tão brilhante.
Palahniuk já chega com um tapa na nossa cara, dizendo “ei, isso não está certo”. Ele joga o podre do capitalismo e do consumismo sobre o leitor, fazendo-o encarar as próprias inseguranças, nosso conformismo e perceber que o consumo desenfreado, que seguir todas as regrinhas vazias, não é a resposta. Contudo, em seguida, o autor também mostra que o niilismo, a autodestruição, talvez não seja a solução também. Especialmente porque a postura de destruição da sociedade e suas regras a qualquer custo se tornou tão alienante quanto a postura de manter a sociedade e suas regras a qualquer custo. Clube da Luta expressa a necessidade de um homem, de uma sociedade, pensante. Expressa a importância de lutarmos contra as verdades prontas, as muitas regras, os instintos ensinados e os instintos naturais. Mas, para isso, é preciso desconstruir o que já existe na mesma velocidade e intensidade com que se reconstrói o novo, o diferente. O caos completo não é a resposta para a ordem excessiva e opressiva.
A EDIÇÃO
A edição, infelizmente, deixou um pouco a desejar. A diagramação está boa, assim como o tamanho e tipo de fonte escolhidos. As páginas amareladas ajudam a deixar a leitura ainda mais rápida. Contudo, há vários erros de ortografia gritantes, com palavras escritas completamente erradas. A capa, felizmente, é um ponto positivo. Ela é chamativa e intrigante, e traz elementos relevantes, como o sabão e o sangue, dentro da história.
CONCLUSÕES FINAIS
É um livro violento e difícil de engolir, que te destrói e te faz encarar verdades que incomodam. Contudo, é também um livro inteligente, atrevido e divertido. Clube da Lutaé uma leitura crítica e obrigatória. A obra consegue entreter ao mesmo tempo em que provoca reflexões. Ninguém é o mesmo depois de ler esse livro. Talvez a trama seja um pouco bizarra demais, os personagens meio malucos, a narrativa irônica e recheada de humor negro, e talvez seja por isso que a obra cativa tanto. Clube da Lutaé viciante e emocionante, que entrou, definitivamente, para os meus favoritos. Recomendo o livro para todos, especialmente os que gostam de obras que desafiam o leitor e, também, para quem curte a área de psicologia.
QUOTES FAVORITOS
“Tyler me arranja um emprego de garçom, depois o mesmo Tyler está colocando uma arma na minha boca e dizendo que o primeiro passo para a vida eterna é que você tem que morrer.” Pág. 9
“Aquilo era liberdade. Perder todas as esperanças era libertador.” Pág. 23
“Você não diz nada porque o clube da lista só existe entre a hora que o clube da luta começa e a hora que ele termina.” Pág. 56
“Se você pode acordar em um lugar diferente. Se pode acordar em um horário diferente. Por que não pode acordar como uma pessoa diferente?” Pág. 196
Título original: Fight Club
Autor: Chuck Palahniuk
Editora: LeYa Brasil
ISBN: 9788582353653
Ano: 2012
Páginas: 272
Compre: Amazon - Submarino - Americanas
Leia também:
- Resenha de Condenada - Duologia Condenada - Vol. 1 - Chuck Palahniuk