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Resenha: Boo - Neil Smith

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A HISTÓRIA

Oliver Dalrymple não é como os outros garotos de treze anos. Conhecido como “Boo”, por causa de seu cabelo espetado e pele muito branca, que o deixam com cara de fantasma de filme, Oliver não tem amigos e sofre nas mãos de alguns colegas o atormentam por ser “esquisito”. Apesar de ser extremamente inteligente, Oliver não é bom com pessoas e prefere ignorar os garotos que fazem bullying com ele concentrando-se nas coisas que realmente gosta: química e biologia. Muito curioso, Oliver adora aprender tudo o que a ciência pode ensinar.

Entretanto, um dia, algo acontece e Oliver acorda em um lugar estranho, e percebe logo que está morto. Ele acha que sucumbiu a uma doença cardíaca, mas não tem certeza. Oliver fica mais intrigado em tentar entender sua nova morada, uma espécie de céu habitado apenas por jovens americanos de treze anos. O garoto, que não acreditava em Deus, que ele chama de Zig, começa então a explorar a cidade em que passará sua pós-vida. Dividido em vários setores, o lugar é administrado pelas crianças, e é cheio de peculiaridades: não existem produtos de origem animal ou livros de ciência ali, os prédios se consertam sozinhos, assim como os ferimentos, que se regeneram com o passar do tempo. 


Em uma tentativa de se adaptar melhor, Oliver começa a escrever uma espécie de diário para seus pais, contando sobre sua pós-vida. Ele relata seus experimentos científicos para compreender a lógica daquele lugar e as pessoas que conhece. Entretanto, tudo se complica quando chega a cidade um antigo colega de Oliver. Johnny era um dos garotos normais, que andava de skate e gostava de esportes. Contudo, ele nunca foi cruel com Oliver e até mesmo conversou com o garoto vez ou outra.

Contudo, a chegada de Johnny não traz alívio por ter um conhecido na pós-vida, e sim confunde e bagunça a cabeça de Oliver. Johnny afirma que ambos foram assassinados a tiros na escola, apesar de que ele não se lembra exatamente de quem era o atirador. Mas, o assassino assombra os sonhos de Johnny, e, um dia, ele afirma ter visto o garoto na cidade. Por não se lembrar da sua morte, Oliver não liga muito por ter sido assassinado. Mas, ele está feliz de finalmente ter um amigo e decide que precisa ajudar Johnny a encontrar o atirador ou qualquer outra pessoa que morava na mesma região que eles e que saiba mais sobre seu assassinato. Assim, os dois garotos começam a viajar pela cidade em busca de respostas, contudo, eles farão descobertas inimagináveis que transformarão a sua pós-vida completamente.


A LEITURA

Eu fiquei imediatamente intrigada quando li a sinopse de Boo. Toda essa coisa de vida após a morte me fascina bastante e achei inusitado o autor trazer um paraíso para onde vão apenas as pessoas da mesma idade e do mesmo país, no caso, jovens americanos de 13 anos. E o começo do livro foi bem divertido nesse sentido, pois, através do Oliver, exploramos bem como essa espécie de céu funciona nos mínimos detalhes. 

Mas se, por um lado, o autor foi bem criativo com o universo que criou para a sua história, a trama em si deixou um pouco a desejar. Não se enganem, Boo traz uma saga interessante, cativante e profunda sobre autodescoberta, amizade, bullying e desejo de vingança, mas a história se arrastou em determinado momento. Infelizmente, Neil Smith não conseguiu dar o ritmo certo para Boo, fazendo com que, assim, o livro tenha uma leitura lenta e cansativa. Na minha opinião, o autor poderia ter ido mais direto ao ponto e cortado, no mínimo, 100 páginas da obra. 
“Ultimamente, não tenho me sentido tão inteligente. Aqui, o conhecimento que tenho sobre amebas, nebulosas e fórmulas é inútil. O que eu preciso é o tipo de inteligência que me ajude a entender por que um menino deveria entrar numa escola e começar a disparar uma arma, por que uma vítima deveria perdoar esse menino, e porque outra jamais o faria.” Pág. 112
Mas, mesmo com um desenrolar lento, esse é umlivro incrível e apaixonante. Boo nos faz refletir muito sobre a natureza humana e como nós nos relacionamos com nós mesmos, entre outras coisas. Além disso, o livro ainda traz uma tensão gostosa, que nos intriga e nos deixa curiosos pelo desfecho, que é completamente genial e inesperado. O final do livro me surpreendeu e emocionou bastante, e terminei a obra feliz por ter insistido na leitura até o final. Eu adorei a narrativa em primeira pessoa, como se Oliver estivesse escrevendo sobre a sua (pós)vida para os seus pais. A escrita de Smith é muito boa, com diálogos bastante divertidos, e conseguiu passar bem a personalidade do narrador. 


OS PERSONAGENS

Além do cenário, Boo encanta com seus jovens, mas profundos personagens. Achei interessante que o autor conseguiu, ao mesmo tempo, criar personagens infantis que convencem quanto a sua verdadeira idade, mas com os quais pessoas em qualquer etapa da vida podem se identificar. Eu, por exemplo, me vi bastante no Oliver. Me identifiquei muito com a dificuldade do garoto em se encaixar e em se relacionar com as pessoas, assim como com sua imensa curiosidade e ceticismo científico. Mas, o Oliver é muito mais do que isso. Ele é aquele garoto estranho, que parece sempre viver em seu próprio mundo, mas que, na verdade, está sempre atento e nota os mínimos detalhes, inclusive aquilo que há de melhor nas pessoas.
“A morte muda uma criança. Nós, citadinos, não somos necessariamente as mesmas crianças que deixamos para trás em nossas vidas pregressas. Eu mesmo sou ligeiramente menos inteligente, e ligeiramente mais sociável do que o menino que deixei encolhido no chão do corredor de uma escola em Hoffman Estates, Illinois. Graças a essa mudança de personalidade, posso sentir empatia por outro ser humano, algo que, admito, tinha dificuldade em fazer na América.” Pág. 190
O Oliver é fofo e divertido, um amigo fiel e estranho que todos nós queríamos ter. O Johnny também é um amor, apesar de trilhar um caminho mais tortuoso que o do Oliver. Johnny chega ao céu com uma fúria imensa, um desejo de vingança que mexe com o leitor e nos faz encarar um aspecto profundo e sombrio da alma humana: apesar da nossa moral dizer que “olho por olho” é errado, lá no fundo, sempre teremos aquele impulso de machucar aqueles que nos machucaram. Eu me cativei bastante com a raiva cega inicial do Johnny, por isso fiquei feliz que ele acaba descobrindo várias coisas ao longo do livro. Eu amei tanto o Oliver quanto Johnny, e jamais conseguiria escolher um favorito entre eles. Boo jamais seria uma obra tão profunda e emocionante como é sem protagonistas tão incríveis e humanos.


A EDIÇÃO 

Quanto a edição, a tradução está excelente, com várias e úteis notas de rodapé que nos ajudam a compreender melhor a história. A diagramação é simples, mas traz um detalhe que faz toda a diferença: os capítulos são números de acordo com o número dos elementos da tabela periódica, detalhe fofo e perfeito, já que Oliver, o narrador, é fissurado pela tabela. A capa do livro é brilhante e combina perfeitamente com a trama. 


CONCLUSÕES FINAIS

Boo é um livro criativo e emocionante, que apesar da leitura lenta, acaba proporcionando um mergulho incrível em um paraíso mágico e divertido. A obraconsegue ser, ao mesmo tempo, charmosa e leve, assim como profunda e sombria. O livro nos faz refletir bastante sobre vida após a morte, natureza humana, desejo de vingança, bullying, autodescoberta e amizade.

Boo é uma história surpreendente sobre como lidamos com a verdade dentro de nós mesmos, sobre como lidamos com a pessoa que somos e qual é o nosso lugar no mundo, o sentido da nossa vida. Questionador e emocionante, com personagens fofos e humanos, com os quais nos identificamos, e pelos quais nos apaixonamos, Boo acabou sendo uma leitura incrível e transformadora. Uma obra única, que recomendo para todos.


QUOTES FAVORITOS

Neste livro que estou escrevendo para vocês sobre a minha vida além-túmulo vocês terão o fundamental. Um dia, espero descobrir um jeito de lhes entregar minha história.” Pág. 7

O fato de eu decorar [a tabela periódica], no entanto, deve ter superexcitado o meu coração, porque imediatamente caí desmaiado no chão. Poderia dizer “desencarnei”, principalmente, considerando meu apelido, mas não gosto de eufemismos. Prefiro dizer a verdade nua e crua. A verdade nua e crua: meu coração parou e eu morri.” Pág. 8

Vocês vão achar isto absurdo, Mãe e Pai, mas esta estagnação no além me entristeceu mais do que a realização da minha própria morte. Eu nunca cresceria, nunca me tornaria um cientista. E, sinceramente, já estava farto do pessoal de 13 anos na América, já tinha visto sua estupidez, crueldade e sua imaturidade.” Pág. 11

Título: Boo
Subtítulo: Minha Vida Após A Morte
Título original: Boo
Autor: Neil Smith
Editora: Fábrica231
ISBN: 9788568432822
Ano: 2016
Páginas: 336
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