A HISTÓRIA
Leonora Shaw, Lee, ou, como prefere ser chamada, Nora, é uma escritora de suspense, cuja rotina se resume a café, corridas e manuscritos. Nora sabe que não deve ser saudável passar seus dias sozinha, em seu apartamento minúsculo, sem conversar com ninguém, mas esse é o único meio que ela encontrou para viver em paz. Contudo, acontecimentos do passado voltam a assombrá-la quando Nora recebe um e-mail estranho, de uma tal Florence a convidando para a despedida de solteira de Clare.
Clare e Lee, como era chamada na época, foram grandes amigas quando eram jovens e Nora namorava o cara mais incrível do universo. Contudo, o que parecia um conto de fadas se tornou um pesadelo tão grande que Lee deixou sua cidade, sua família e seus amigos para trás, sem dizer adeus, para se tornar Nora, uma escritora reclusa, mas independente. O convite para a despedida de solteira é uma grande surpresa, afinal, Nora nem sabia que Clare ia se casar, mas, quando descobre que Nina, uma amiga da mesma época, mas com a qual tem mais contato, também vai, Nora resolve que, talvez, seja hora de encarar o passado de frente.
É assim que Nora acaba indo passar um final de semana sombrio e nevado, em uma casa envidraçada no meio de um bosque escuro no interior da Inglaterra. Para piorar a situação, Nora está cercada pelos estranhos amigos de Clare, sendo que um deles está ansioso para descobrir todos os segredos que Nora esconde e outra é capaz de qualquer coisa para garantir que sua adorada amiga tenha a despedida de solteira perfeita. Se não bastante, Nora ainda tenta evitar que Nina cause brigas entre os presentes ao mesmo tempo que tenta entender porque diabos Clare a queria ali. A escritora ainda luta com os velhos hábitos quando lembranças do passado começam a perturbá-la e ela percebe que está voltando a ser a velha Lee, que vivia na sombra de Clare, adorando-a.
“- As pessoas não mudam – disse Nina com amargura. - Elas só ficam mais habilidosas para esconder o que realmente são.” Pág. 137
Uma casa isolada, com grupo de adultos tensos em meio a muita bebida, brincadeiras estranhas e farpas maldosas, parece ser o cenário perfeito para uma tragédia. O fim de semana acabou e Nora acorda no hospital, coberta de sangue e com a certeza de que alguém está morto. Contudo, a memória de Nora está em branco e ela não consegue se lembrar como uma despedida de solteira acabou virando caso de polícia. Os fatos não se encaixam e tantas perguntas deixam Nora completamente desnorteada. Mas, ela precisa saber o que aconteceu, o que ela fez, antes que seja tarde demais.
A LEITURA: TRAMA E NARRATIVA
Eu estava animada para ler Em Um Bosque Muito Escuro. Eu adoro obras de suspense e essa prometia ser uma boa leitura. Contudo, o livro conseguiu ir além e ser uma leitura tão cativante que devorei todas as 288 em uma noite, e tão tensa e sombria que até fiquei arrepiada em vários momentos e com um pouquinho de medo de ficar sozinha no escuro.
Desde o início somos intrigados pelo passado traumático de Nora e, por mais que ele demore a ser revelado, vale a pena quando descobrimos o que aconteceu. Dezenas de teorias passaram pela minha cabeça, mas Ruth Ware conseguiu me pegar de surpresa completamente. Todo esse clima de tensão e mistério se tornam ainda mais fortes porque Em Um Bosque Muito Escuroé narrado na voz da Nora, e a autora tem uma escrita fluída e envolvente, que consegue intrigar e construir um bom clima de suspense.
Com personagens com passados misteriosos, mágoas e desavenças entre si, e uma casa sinistra no meio de um bosque escuro, a autora constrói o cenário perfeito para uma tragédia e a narra com perfeição também. A trama tem alguns clichês clássicos de histórias como essa, mas, como já disse, ainda assim ela consegue ser bastante surpreendente. É interessante acompanhar como passado e presente vão se misturando e como os acontecimentos de anos atrás acabam sendo decisivos para que possamos compreender as ações dos personagens no presente. Para mim, Em Um Bosque Muito Escuro acabou sendo uma história sobre mágoa, inveja, traumas e, principalmente, como podemos conhecer uma pessoa sem realmente conhecê-la. Foi uma leitura rápida e muito, muito gostosa.
OS PERSONAGENS
Quanto aos personagens, eles começam bastante clichês, mas acabam melhor se desenvolvendo e nos surpreendo ao longo da história. A nossa protagonista, Nora, é a típica escritora reclusa e sombria, presa em um passado traumático. Contudo, depois de alguma luta claro, ela começa a se livrar das amarras de seu trauma e finalmente conseguir algum tipo de encerramento. Entretanto, antes disso, acabamos duvidando bastante da índole e até da sanidade da personagem, o que, para mim, só tornou Em Um Bosque Muito Escuro uma leitura ainda mais rica, afinal, adoro protagonistas que nos intrigam e nos fazem duvidar deles.
“O cérebro não lembra bem. Ele conta histórias. Preenche as lacunas, implanta essas fantasias como lembranças. Preciso descobrir os fatos. Mas eu não sei se estou me lembrando do que aconteceu, ou se é o que eu quero que tenha acontecido. Sou uma escritora, sou uma mentirosa profissional. É difícil saber quando parar, sabe?” Pág. 162
Dos personagens secundários, eu adorei a Nina, uma médica sem papas na língua, que gosta de ver o circo pegando fogo, mas que é bastante fiel a amizade e carinho que tem pela Nora. Contudo, em alguns momentos, me irritei com as atitudes da Nina e também fiquei na dúvida se ela era tão boazinha quanto parecia. Já a Florence e os outros amigos da Clare me irritaram por grande parte da história, apesar que até consegui simpatizar com eles no final. A Clare por si mesma me causou uma montanha-russa de sentimentos: em alguns momentos gostei da personagem, mas em outros a odiei, e também duvidei de suas intenções e atitudes, como também aconteceu com a Nina. Mas, como podem imaginar, tantos personagens duvidáveis só tornou o suspense de Em Um Bosque Muito Escuro ainda melhor!
A EDIÇÃO
Falando de edição, a tradução estava boa e o texto sem qualquer tipo de erros. Achei o tamanho das letras um pouco pequeno, mas nada que atrapalhasse a leitura. A diagramação é simples, sem qualquer detalhe muito elaborado, o que acaba sendo bom, pois assim nos focamos totalmente na história. A capa de Em Um Bosque Muito Escuro é muito bonita, eu adorei o título em vermelho em contraste com a floresta sombria (um elemento bem importante na trama, como podem imaginar).
CONCLUSÕES FINAIS
Uma leitura rápida e tensa do início ao fim, Em Um Bosque Muito Escuro me envolveu e surpreendeu de forma incrível. Esse suspense me deixou arrepiada como há muito tempo não ficava com um livro. Em sua narrativa de ficção sombria e trágica, a obra acaba sendo um alerta para o perigo real de se envolver em relacionamentos tóxicos (tanto românticos quanto de amizade) com pessoas que, por baixo de sorrisos e abraços, escondem um ego gigante, autocentrado e um prazer sombrio em triunfar sobre as feridas alheias. Em Um Bosque Muito Escuro beira ao bizarro, mas seu cenário sombrio e personagens de caráter duvidável proporcionam uma suspense irresistível. Mais que recomendado.
QUOTES FAVORITOS
“Doí. Tudo doí. A luz nos olhos, a dor de cabeça. Tenho o odor de sangue nas narinas, minhas mãos estão pegajosas de sangue. (…) O que aconteceu? O que foi que eu fiz?” Pág. 11
“Há dias em que não ouço uma única voz humana, fora do rádio, e sabe de uma coisa? Gosto muito disso. É uma boa vida para uma escritora, em muitos aspectos – sozinha com as vozes na sua cabeça, personagens que você criou. No silêncio, eles se tornam muito reais.” Pág. 12
Título: Em Um Bosque Muito Escuro
Título original: In a Dark, Dark Wood
Autora: Ruth Ware
Editora: Rocco
ISBN: 9788532530387
Ano: 2016
Páginas: 288
*Esse livro foi uma cortesia da Editora Rocco